segunda-feira, 23 de maio de 2011

Escola Clássica X Escola Positiva

Beccaria
    
    No inicio da século XVIII na Itália  o Marquês de Beccaria fez surgir o chamado movimento humanitário em relação ao Direito de punir estatal, mostrando-se contra as penas de caráter cruel e principalmente a desigualdade das penas determinada pela classe social do delinqüente.

    Inspirando-se na filosofia estrangeira sobretudo em Montesquieu, Hume e Rosseau, Beccaria baseou seu pensamento nos princípios do contrato social, do direito natural e do utilitarismo.

    Beccaria foi um contratualista, igualitário, liberal, individualista, sendo assim, abusava do critério de DEDUÇÃO, formulando princípios a priori e deduzindo depois, afastava-se do contato com a realidade.

    Em seguida à generosa iniciativa de Beccaria, o estudo da justiça penal ( sistematizado sobre novas bases, ou seja, suas normas se deduzem de princípios fundamentais como o do contrato social, o da proporcionalidade das penas etc) determinou a formação de uma grande corrente científica que passou a se chamar ''Escola Clássica Criminal" (nome dado por Enrico Ferri em 1880 em pronunciamento na Universidade de Bolonha).
   
    A Escola Clássica em reação contra os excessos medievais estabeleceu-se em 3 principais idéias:

    I - Estableceu a razão e o limite do poder de punir do Estado

    II - Opôs-se a ferocidade das penas e abolindo penas capitais, corporais e infamantes, limitando a abrangência das penas conservadas ( ex = privativa de liberdade)

    III - Reinvidicou garantias individuais na persecução penal e fora dela


    A Escola Clássica abandonou  a primitiva corrente realística, afirmada parcialmente nos trabalhos de Fuerbach e Benthan (sobre a causa dos crimes e sua prevenção) e voltou sua atenção exclusivamente  sobre o crime e a pena como entidade jurídica abstrata, isolada do homem delinqüente e do ambiente em que esse provém e a que deve voltar depois da pena.

    Nas palavras de Enrico Ferri: "Em torno dessa entidade jurídica abstrata, o pensamento clássico propôs um simétrico de normas repressivas, com o fundamento único da lógica abstrata e apriorística, em que consiste precisamente o método dedutivo" (FERRI, Enrico; pagina 59; 1998)

    Para Escola Clássica o agente que opta pelo conduta delituosa baseou-se em seu "liver arbítrio" para realização do fato típico, ou seja, a Escola Clássica inspirada pela doutrina do "Direito Natural" se afasta da ciência social, valendo-se da critério de dedução a Escola não procura investigar o "motivo" que levou o agente a descumprir a norma.

    A Escola clássica começou a entrar em declínio quando percebeu-se que a criminalidade apenas aumentava apesar de posto em prática suas idéias básicas, o motivo era obvio, o método dedutivo ou de lógica abstrata faz perder de vista o criminoso, enquanto que na justiça penal ele é o protagonista vivo e presente.
    
    Como bem assevera Enrico Ferri acerca do declínio do pensamento dos clássicos:
''Nem podia ser de outra forma, não obstante o engenho dos grandes criminalistas clássicos, em vista do método por eles adotado, pois que não se preocupando em conhecer cientificamente a realidade humana e as causas da delinqüência, não era possível que delas indicassem os remédios adequados" (FERRI, Enrico; página 61; 1998)
Ferri

    Apesar da grande contribuição dos clássicos ao Direito Penal, era imperioso que houvesse mudanças no pensamento, aparece então uma nova corrente, a chamada "Escola Positiva".

    É ainda da Itália que provém  este influxo de renovação.

    Lombroso em 1876 publica o célebre livro "o homem Delinqüente", em 1877 Garofalo secunda-o  tentando aplicar ao Direito Penal as novas idéias, , em 1878 Ferri ataca a doutrina clássica baseada no livre arbítrio.

    Lombroso por ser antropólogo trouxe ao pensamento dos clássicos aspectos relacionados a  fatores anatômicos, fisiológicos e mentais do delinqüente. A base da teoria desenvolvida po Lombroso foi o atavismo, ou seja, retrocesso atávico ao homem primitivo. Depois, a falta de desenvolvimento psíquico. Por ultimo, a agressividade explosiva do epilético.

    Ferri, sociólogo, iniciou o estudo do crime como fato social, por isso ainda hoje é conhecido como o "pai da sociologia criminal".

    Garofalo acrescentou o aspecto normativo, como jurista fez a aplicação das novas teorias ao Direito.

    Ao passo que Beccaria e seus continuadores usaram o método dedutivo, os positivistas preconizavam a aplicação do método EXPERIMENTAL às ciências sociais, defenderam-no e empregaram-no no estudo dos criminosos e do crime.

    Observaram os delinqüentes seus modos de vida, sua fisiologia, morfologia e psicologia, comparando-os com pessoas normais, analisaram o movimento e as causas da criminalidade, valendo-se de estatísticas.

    Daí começou o movimento em que era dada mais atenção a personalidade do réu ou condenado, procurando detectar anormalidades durante o processo ou cumprimento da pena, descobrir pscicopatias que antes passavam despercebidas.

    Os positivistas preconizam o método preventivo para combater a criminalidade, buscando o motivo das condutas criminosas e evita-las antes que ocorram.

    Ao longo dos anos muitas outras escolas criminais surgiram, sempre utilizando das idéias das duas principais escolas aqui apresentadas, porem é nítido nos dias de hoje que o Estado já não possui a função única de repressor (punir quem não o respeita), nem mesmo de garantidor (garantir os direitos de seus cidadãos), mas sim de PRESTADOR, ou seja, não deve ele olhar para individuos como eleitores, consumidores etc e sim como seres humanos, dando-lhes garantias mínimas de sobrevivência para que tenham opções que não a criminalidade, não há como estudar o crime sem antes observar as condições socias que levaram o agente a delinqüir. 

BIBLIOGRAFIA:

FERRI, Enrico. Princípios de direito criminal: o criminoso e o crime/ Enrico Ferri; prefácio do Prof. Beleza dos Santos; tradução de Paolo Capitanio. - 2.ed. - Campinas: Bookseller, 1998.

LOMBROSO, Cesare. O homem delinquente.São Paulo: Ícone. 2007.

BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. São Paulo: Editora Rideel, 2003. 



     
    

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Teoria da Imputação Objetiva - Claus Roxin


Claus Roxin

   
     A teoria em questão surgiu no final da década de XX, onde era usada exclusivamente no âmbito do direito civil. Passado alguns anos, na década de sessenta esta teoria começou a ter enfoque na área criminal, dois autores alemães se destacaram transportando este estudo para o Direito Penal, são eles, Claux Roxin e Jakobs, aqui iremos abordar mais especificamente as idéias de Roxin.

    A teoria da imputação objetiva não elimina a teoria da equivalência dos antecedentes causais, na verdade ela funciona como uma restrição à análise do nexo causal, ou seja, ela restringe a imputação do delito ao agente.

    Para melhor compreensão de referida teoria devemos abordar mesmo que superficialmente a chamada "conditio sine qua non" ou também chamada teoria da equivalência dos antecedentes causais.

CONDITIO SINE QUA NON

     Para essa teoria a conduta é a causa do resultado, tudo aquilo que concorrre para que o resultado ocorra será causa dele. Por exemplo, Maria esfaqueia Ana que vem a falecer. Aplicando-se referida teoria, os pais de Maria são responsáveis pelo resultado, assim como seus avós e bisavós, a responsabilidade da morte de Ana também pode ser imputada ao fabricante da faca, pois sem qualquer um deles o resultado não teria ocorrido.

    Podemos vislumbrar portanto, que a teoria do Conditio Sine Qua Non chega ao absurdo de elevar ao infinito a imputação do delito.

  Buscando rechassar a responsabilidade penal objetiva, alguns elementos surgem para frear esse regresso infinito, o primeiro deles é a análise do dolo e da culpa que já foram observados como elementos da conduta, é a chamada causalidade específica, adotada pelo Código Penal, ou seja, só responderá pelo resultado quem teve dolo ou culpa em relação a ele.
 
    Modernamente, a partir dos anos setenta, funcionando como um terceiro filtro para reduzir a imputação surgiu a teoria da imputação objetiva.
 
NATUREZA JURÍDICA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA
 
    Apesar de existirem posicionamentos no sentido de que tal teoria exclui a antijuridicidade, corrente majoritária afirma que a teoria da imputação objetiva exclui a tipicidade, uma vez que rompe o nexo de causalidade que é elemento integrante do fato típico.
 
 
ELEMENTOS DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA

1) Ação diminuidora do risco

    Ocorre quando o agente lesa um bem juridico menor de uma pessoa para preservar um bem jurídico maior de uma mesma pessoa ou de terceiros, nesse caso ele não responde pelo resultado. Por exemplo, Maria atira um vaso em Kely para matá-la, porém Luiz desvia o objeto que atingi Bruna que passava pelo local, esta vem a sofrer lesões corporais.

    Pela teoria clássica do crime, Luiz teria cometido um fato típico, porém com excludente de antijuridicidade, uma vez que agiu em legítima defesa de terceiros.

    Para a teoria da imputação objetiva, não há sequer fato típico, já que houve quebra de nexo causal.

2) A conduta deve criar ou aumentar um risco socialmente inadequado.

    Como o próprio nome já diz, a conduta além de criar ou aumentar um risco, este deve ser anormal, não tolerado socialmente. Por exemplo, Maria planejando a morte Dani, compra-lhe uma passagem de avião para a China, na esperança de que ocorra um acidente e o avião exploda, e isso ocorre, causando a morte de Dani como o arquitetado.

    Pela teoria da conditio sine qua non, mesmo aplicando-se a causalidade específica, Maria responde pelo homicídio de Dani, isto é, agiu com dolo e sem sua conduta não teria ocorrido a morte desta.

   Pela teoria da imputação objetiva, Maria não responderia por nada, pois comprar uma passagem de avião é um risco socialmente tolerado, portanto, permitido e aceito pelo senso comum.
 
3) Que o resultado produzido esteja abrangido pela norma.

    Segundo a teoria da imputação objetiva, o tipo penal não abrange dois resultados:
 
3.1) Princípio da autonomia da vítima.

    Aqui vemos o resultado assumido voluntáriamente pela vítima, ou seja, a autorresponsabilidade. Por exemplo, Luiz, embriagado, ao sair de uma festa , dá carona para Dani, maior de idade, no trajeto o carro  capota e Dani vem a falecer.

    Pela teoria da imputação objetiva, não há como imputar a morte de Dani à Luiz, já que essa colocou-se em situação de risco voluntariamente.


 Pela raciocínio clássico Luiz responderia por homicídio (com divergências doutrinarias acerca de dolo eventual ou culpa consciente). 
 
3.2) Resultado não previsto no tipo.

      O agente não responde pelo resultado quando após a sua conduta, este é produzido por alguém que tinha o dever jurídico específico de impedí-lo. Por exemplo, Marcos fere dolosamente a perna de Bruna, no hospital sua perna é amputada por erro médico.

    Pela visão tradicional, Marcos responderia por lesão corporal gravíssima pela perda de membro, uma vez que, o erro do médico está na mesma linha de desdobramento de sua conduta, isso porque incidiu sobre a perna atingida por ele, ficando inviabilizado a aplicação do Art. 13 § 1º :

Art. 13 - O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.

Superveniência de causa independente

§ 1º - A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou.
4) A realização do plano do autor

     É o ultimo critério proposto por Roxin, visa estender a imputação objetiva à analise do dolo.Surge como princípio essencial para imputação de um delito consumado a título de dolo.
Podemos vislumbra-lo no caso de "aberratio ictus":

Art. 73 - Quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa, responde como se tivesse praticado o crime contra aquela, atendendo-se ao disposto no § 3º do Art. 20 deste Código. No caso de ser também atingida a pessoa que o agente pretendia ofender, aplica-se a regra do Art. 70 deste Código.
    Para o Código Penal, aplicando-se aberratio ictus, ou erro na execução, Luiz responderia por homicídio consumado, considerando que este tivesse matado a chamada "vítima virtual" (a pessoa a quem ele queria matar).


      Por exemplo, Luiz atira em Dani para matá-la, mas atinge por acidente sua mulher Maria, que vem a falecer.


       Para Roxin, embora completo o tipo objetivo e o resultado absorvido pela vontade do autor, aquele não pode ser imputado a título de dolo, ou seja, a ação deve realizar um perigo não permitido e existe um princípio de imputação ao aspecto subjetivo do tipo, qual seja a realização do plano do autor. No caso em questão Luiz deveria responder por homicídio tentado em concurso formal de crimes com homicídio culposo, aplicando-se o critério de exasperação das penas (concurso formal).

         Trata-se de critério intermediário entre duas teorias, a da concreção (que prima pela relevância do erro, imputando apenas uma simples tentativa) e a teoria do igual valor ( que imputa uma espécie de crime doloso consumado).

terça-feira, 3 de maio de 2011

Societas delinquere potest - Responsabilidade penal das pessoas jurídicas com relação ao texto constitucional


  Para melhor compreensão do tema começaremos a abordagem com uma breve consideração acerca das pessoas jurídicas.

  Para Caio Mário, a necessidade da conjugação de esforços de vários indivíduos para atingirem objetivos comuns, sugerem ao ordenamento jurídico equiparar a própria pessoa humana certos agrupamentos de indivíduos e certas destinações patrimoniais, atribuindo aos entes abstratos personalidade e capacidade de ação.

  Hoje não temos a menor dúvida de que a pessoa jurídica é um sujeito de direito e obrigações, da mesma forma que a pessoa física.

 Com relação a natureza da pessoa jurídica, os doutrinadores enumeram uma longa série de teorias dais quais podemos perceber três tendências:
  
TEORIAS NEGATIVAS.

  Considera que apenas as pessoas naturais seriam capazes de direitos e obrigações, não aceitam a existência da personalidade das organizações.

   Nas palavras do ilustre doutrinador Fausto Martin de Sanctis "Não se concebia uma coletividade orgânica independente dos indivíduos, seus participantes, com personalidade jurídica, pois seus bens reputavam-se de propriedade comum para fruição de seus formadores".


TEORIAS DA FICÇÃO DA PESSOA JURÍDICA.

   Tais teorias consideram as pessoas jurídicas como uma criação artificial da lei, carecendo de realidade.

   Desenvolvida na Alemanha, essas teorias perduraram por muito tempo.

    A concepção geral da ficção foi desenvolvida por Savigny, que considera que cada direito deve essencialmente pertencer a um ser humano. Porém o legislador na intenção de facilitar determinadas funções concede ao agrupamento de pessoas uma certa autonomia.

TEORIAS DA REALIDADE.

    Os defensores mais conhecidos das teorias da realidade são, Otto Gierke e Ziterlmann, para tais autores a pessoa jurídica indiscutívelmente existe, independente das pessoas naturais que a compõem.

     Contrapondo-se a idéia de Savigny, para quem as pessoas jurídicas só existem ficticiamente, daí a definitividade dos autores da parêmia "Societas delinquere non potest", a teoria defendida por Gierke e Ziterlmann considera que o papel assumido pelos entes coletivos fez com que estes não fossem mais considerados pessoas fictas.

    O escopo dessa teoria é afirmar e demonstrar a real existência de um ente coletivo.

    A tendência da realidade é sem dúvidas a mais adequada e aceita na dourtina, pois pouco a pouco se verificou que na pessoa jurídica há uma vontade superior demonstrando a sua existência independente dos membros que a compõem.




  No que tange a responsabilidade penal da pessoa jurídica, trabalharemos com a tendência da realidade, uma vez que, tanto as teorias negativas quanto as teorias da ficção jurídica não possibilitariam a imputação criminal aos entes coletivos pois não admitem sua existência.

    Iremos agora enumerar as críticas com relação a pessoa jurídica figurar no polo ativo de uma infração penal com enfoque na Constituição da Republica:

---> A primeira crítica em relação ao texto constitucional diz respeito ao artigo 225, que deixaria dúvidas quanto a responsabilização dos entes coletivos se interpretado literalmente:   


§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

   Seguindo a linha de pensamento dos que defendem a irresponsabilidade penal das pessoas jurídicas, faltaria ao texto citado a expressão "respectivamente" depois da palavra "administrativas" havendo, assim, um lapso do constituinte.

    Ainda com relação ao texto constitucional, ao se verificar o disposto no Art. 173 § 5º:

§ 5º - A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular.
    Os adeptos da irresponsabilidade criminal dos entes coletivos argumentam que referida norma ao preceituar a expressão "compatíveis com sua natureza" estaria o texto constitucional criando um óbice para a  imputação criminal da pessoa jurídica.

    Com todo respeito aos doutrinadores que defendem as teses em pauta, tais interpretações ao nosso ver não devem prevalecer, com uma simples leitura, ainda que se proceda uma interpretação sistemática, não podemos chegar a conclusão no sentido de se adotar o preceito "Societas delinquere non potest".

     Antonio Evaristo de Moraes Filho ao proceder uma pesquisa sobre a origem do dispositivo 175 § 5º, na Comissão de Sistematização, descobriu em sua redação original a seguinte frase: "lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos integrantes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade criminal desta".

     Não resta dúvida que a mudança de texto do legislador não significa a exclusão da responsabilidade penal dos entes jurídicos, já que o artigo em apreço manteve a intenção inovadora do legislador constituinte, apenas salientando o óbvio de que algumas sanções criminais não se adequariam a penalisação de um ente jurídico, como é o caso da privação de liberdade.

    No artigo 225 § 3º o texto não deixa margem para interpretação distinta da responsabilização criminal da pessoa jurídica.

    Nas palavras do mestre Fausto de Sanctis: "O legislador constitucional, atento às novas e complexas formas de manifestações sociais, mormente no que toca à criminalidade praticada sob o escudo das pessoas jurídicas, foi ao encontro da têndencia universal da responsabilização criminal".

     Nesse ponto do estudo, cumpre salientar que a Constituição da República não limitou a responsabilização criminal das pessoas jurídicas apenas nos casos de conduta lesiva a ordem econômica e financeira, economia popular e ao meio ambiente. Ao cita-los no texto constitucional o legislador apenas reservou a estes bem jurídicos uma tutela especial, abrindo-se assim precedente para que o legislador infraconstitucional estabeleça se for o caso a responsabilização criminal dos entes coletivos quando estes atentarem contra outros bem jurídicos.      
    

---> A segunda crítica por parte dos adeptos da irresponsabilidade está no artigo 5º:
XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido;
       Referida norma consagra o princípio da personalidade da pena, ou seja, nenhuma pena poderá atingir pessoa que não a do réu, nesse sentido os doutrinadores que não admitem a responsabilização penal da pessoa jurídica argumentam que ao punir o ente coletivo estaria punindo todas as pessoas físicas que fazem parte da sua estrutura, sócios que muitas vezes nem sequer sabiam da conduta delituosa seriam atingidos pela pena, estaria sancionando pessoas inclusive sem dolo ou culpa, o que caracterizaria a responsabilidade penal objetiva que é vedada em nosso ordenamento.

        Tal pensamento não pode prosperar sobre a égide do princípio em apreço, uma vez que, o princípio da personalidade da pena é interpretado de forma relativa, por exemplo, ao prender um pai de família como não dizer que aquela conduta terá reflexos indiretos em sua esposa e seus filhos ? É inegável que Indiretamente a sanção penal sempre acaba atingido pessoas além do condenado. O mesmo raciocínio se encaixa com relação aos entes coletivos, o sócio "inocente" pagará indiretamente pela má administração de sua sociedade, sem qualquer ofensa ao texto constitucional.

         Futuramente iremos abordar a responsabilidade das pessoas jurídicas com base na teoria do crime.




BIBLIOGRAFIA


SANCTIS, Fausto Martin de. Responsabilidade penal das corporações e criminalidade moderna. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009


PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996


MORAES FILHO, Antonio Evaristo de. Crimes contra a economia popular. In: Direito penal dos negócios. São Pulo: Associação dos Advogados de São Paulo, 1990